quinta-feira, 27 de dezembro de 2012

Sons Binaurais



Ondas Cerebrais, Sincronização Hemisférica e a Tecnologia do Sono.

Nas últimas décadas, os pesquisadores do sono e do sonho produziram uma quantidade substancial de conhecimento devido, sobretudo ao desenvolvimento e aplicação de novas tecnologias.
Por exemplo, o eletroencefalógrafo, ou EEG, é capaz de monitorizar mudanças nas frequências e padrões das nossas ondas cerebrais. O nosso cérebro produz ondas de correntes que fluem através das ligações neurais. O tipo de onda cerebral é definido pela frequência a que esta pulsa e este tipo particular de pulsação influenciará o nosso estado mental respectivo.
Existem quatro tipos básicos de padrões de ondas cerebrais, mas devido à complexidade do cérebro humano existem frequentemente diversos padrões interagindo simultaneamente. É a predominância de um padrão sobre os outros que determina o nosso estado de consciência.
Abaixo apresento uma descrição de cada um dos quatro principais padrões bem como o seu intervalo de frequência e respectivo estado mental.

Ondas Beta: São as ondas mais rápidas, 13 a 30 Hz. Este é o padrão que obtemos ao monitorizar o nosso cérebro durante o estado de vigília. Ou seja, se neste momento efetuasses um EEG este obteria um aspecto típico de um padrão de ondas Beta.

Ondas Alfa: Mais lentas que as Beta, 7 a 13 Hz. Estão normalmente associadas a um estado de maior tranquilidade e relaxamento. Podem ser encontradas durante os estados meditativos mais comuns.

Ondas Theta: 3 a 7 Hz. Estão associadas a um estado de grande capacidade de reminiscência, criatividade e visualização, inspiração e conceptualização holística. É o padrão cerebral representativo do sono REM, ou seja, do sonho.

Ondas Delta: São as mais lentas dos 4 padrões principais, 1 a 3 Hz. Estão associadas ao sono profundo, sem sonho, e ao transe profundo.
Sabendo as características mentais associadas a cada padrão de ondas cerebrais, tal como foram acima referidas, teríamos uma enorme vantagem em induzir um determinado padrão de ondas à facilitar determinadas atividades mentais. Felizmente existe uma forma para fazer isto e baseia-se no princípio científico da Harmonização. Os sons binaurais podem ser usados para harmonizar ou sincronizar ambos os hemisférios cerebrais num só padrão sinérgico de ondas cerebrais.
O que é então o princípio da Harmonização? É muito simples. Por exemplo, vamos supor que penduramos nas paredes da mesma sala vários relógios de pêndulo e que cada pêndulo se move ao seu próprio passo, defasado de todos os outros. Com a passagem do tempo os pêndulos tornar-se-ão progressivamente sincronizados, adaptando-se naturalmente o ritmo de cada um até todos os pêndulos se moverem em sintonia, em uníssono. Esta sincronização é o resultado do princípio da harmonização, é um fenômeno físico que ocorre de forma sistemática na natureza sempre que a oportunidade se proporcione.
Este processo é importante, pois também possuem implicações diretas ao nosso cérebro, que opera de modo semelhante a uma caixa de ressonância. As ondas cerebrais pulsam a diferentes amplitudes e frequências, dependendo do nosso grau de envolvimento em determinadas atividades. Tal como o pêndulo do relógio, o nosso cérebro pode ficar sincronizado com determinados padrões de ondas se for exposto aos estímulos apropriados. Este é também um processo usado pelos xamãs em diversas tribos indígenas, que usam tambores e chocalhos para harmonizar as suas ondas cerebrais com uma frequência particular e assim entrar num estado de consciência alterado.
Juntamente com o papel desempenhado pelas ondas cerebrais no nosso estado de consciência é também importante discutir a anatomia básica do nosso cérebro e a forma como as suas partes interagem e funcionam. Os nossos cérebros possuem dois hemisférios, esquerdo e direito. O hemisfério esquerdo é linear, lógico, prático e orientado no tempo. Por seu turno, o hemisfério direito prece ser muito mais não linear, abstrato, criativo, holístico e não lógico. Por exemplo, um contabilista usa provavelmente muito mais o seu hemisfério esquerdo enquanto que um artista usa mais o direito. Tendemos a favorecer o uso de um determinado hemisfério consoante a atividade em que estamos concentrados. Assim como existe uma predominância de certas ondas cerebrais dependendo de determinadas atividades também existe a predominância de um dos hemisférios consoante o que estamos a fazer.
Os dois hemisférios estão ligados pelo corpo caloso. Esta estrutura funciona como uma ponte ou conduta entre ambos os lados e pode literalmente ser exercitada e fortalecida mentalmente até se tornar fisicamente maior e mais capaz de transmitir informação entre os dois hemisférios. Sincronizando os dois hemisférios e permitindo que estes trabalhem em conjunto podemos potencializar as nossas capacidades mentais. Basicamente, é como ter um computador mais rápido com os componentes mais integrados, capaz de aceder mais rapidamente à informação e processamento de dados. Tornando o nosso cérebro mais eficiente.
E como podemos então fazer isto? Vários estudos demonstraram que a meditação pode conduzir a estados em que o padrão de ondas cerebrais reflete uma sincronização entre os hemisférios cerebrais. Esta sincronização reflete um estado especial em que ambos os hemisférios estão ativamente envolvidos nas mesmas frequências. Os EEGs de meditadores experientes exibem uma sincronização hemisférica acima do comum bem como a capacidade de atingir estes estados deliberadamente. Ambos os hemisférios podem estar sincronizados em qualquer padrão de ondas cerebrais tais como Alfa ou Theta, ou qualquer outra combinação. Esta característica conduz-nos ao próximo tópico de interesse: os sons ou batidas binaurais.
A melhor forma de explicar os sons binaurais é descrevendo por que e como são feitos, mas primeiro será melhor abordar um pouco o seu criador. Robert Monroe, o pioneiro das experiências fora-do-corpo, fundou o Instituto Monroe na Virgínia, EUA. Esta é uma organização dedicada ao estudo da consciência e seus estados modificados. Ao longo de anos de pesquisa desenvolveram um processo capaz de alterar sistematicamente os padrões de ondas cerebrais de forma a induzir estados de consciência particulares. Monitorizando os sujeitos em estados alterados, Monroe e os seus colaboradores realizaram experiências com o som para modificar o estado mental de uma forma previsível e controlada. Com o tempo, esta equipe de pesquisadores desenvolveu o processo de criar sons binaurais. Este processo utiliza o princípio da Harmonização acima descrito para conduzir o cérebro a frequências de ondas cerebrais específicas e pré-determinadas.
Criar frequências de sons binaurais é na verdade muito simples, é quase mais fácil fazê-lo do que explicá-lo! Este processo consiste basicamente em aplicar estímulos auditivos em ambos os ouvidos. A ideia é tocar um tom num ouvido e outro tom, ligeiramente diferente, no outro ouvido. Ao processar estes dois tons captados pelo ouvido direito e esquerdo, o cérebro assimila a diferença entre os mesmos e, num efeito de harmonização, entra nesta frequência. Ou seja, se o nosso ouvido esquerdo captar um som com uma frequência de 97 Hz e o direito captar um som com uma frequência de 103 Hz, o nosso cérebro irá reconhecer um diferencial de 6Hz e assim entrará nesta frequência, que se enquadra no intervalo de ondas Theta. De igual forma o nosso comportamento começará gradualmente a alterar-se, entrando num estado de profundo relaxamento e sono.
Ao escutarmos estes sons binaurais podemos perceber um tom ondulante. O fantástico é que este tom ondulante não está a ser transmitido pelos headphones, este efeito de vibração é na verdade uma criação da nossa mente, ao sintetizar os dois sons. Quando escutamos um tom num ouvido e outro tom, ligeiramente diferente, no outro ouvido, os hemisférios do nosso cérebro ficam sincronizados e é esta sincronização que produz este tom ondulante.

Demonstração de um padrão de som binaural
Usando esta tecnologia, o Instituto Monroe, e posteriormente outras empresas, desenvolveu uma linha de cassetes e CDs Hemi-Sync. Usando estes CDs podemos atingir de modo viável determinado estado de consciência. Existem CDs usando este princípio criados com diferentes propósitos, por exemplo: potenciar a aprendizagem, deixar de fumar, facilitar o sono, promover uma cura mais rápida, induzir sonhos lúcidos e facilitar a ocorrência de experiências fora-do-corpo.
Concluindo, podemos verificar que, devido ao advento da ciência e ao desenvolvimento da tecnologia, a cultura ocidental parece finalmente ter encontrado as suas próprias formas de induzir estados de consciência alterados entre os quais podemos encontrar o sonho, comum ou lúcido. Assim, podemos usar esta tecnologia para nos ajudar a ter sonhos, a potenciar a sua retenção e recordação e até para nos orientar durante os mesmos. Isto é algo que os xamãs ou os monges do Tibete descobriram e fazem desde há séculos usando métodos naturais, no primeiro caso através da ingestão de psicodélicos naturais e no segundo através da meditação e Yoga dos sonhos.

Instruções Úteis para o uso correto:

1. Deverá ser ouvido com fones de ouvido com capacidade ESTEREO (mais aconselhado) ou por um bom sistema de som também ele configurado para ESTEROFONIA.

2. Não deverá ser escutado muito alto. O suficiente para que não ocorram distrações vindas do exterior.

3. Deverá colocar-se numa posição confortável (de preferência olhos fechados) e garantir que não será perturbado.

4. A audição de batidas binaurais pode induzir a estados de perda de consciência o que pode ser perigoso a quando a condução de máquinas ou automóveis, assim que se recomenda precaução.

segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

Protocolo de Fast Hug






Idealmente constitui o público-alvo de unidades de terapia intensiva pacientes que preenchem o perfil de doente crítico, portador distúrbio fisiológico grave, por vezes multissistêmico, decorrente de condição clínica aguda (traumas, intoxicações) ou crônicas agudizadas (pneumonia aspirativa grave em paciente com DPOC, IAM extenso em cardiovasculopata de longa data).
Tendo em vista a complexidade da estratégia de suporte clínico necessária, torna-se cada vez mais freqüente o advento de protocolos ou métodos de checklist empregados na rotinas dos cuidados de UTI.
Fast Hug, expressão inglesa que pode ser traduzida como Rápido Abraço, corresponde a uma mneumônica que se destina a servir como lembrete ao profissional médico responsável por unidades de terapia intensiva a respeito de pontos-chave no manejo de pacientes críticos.
Jean-Louis Vincent (in Crit Care Med 2005 vol 33 N 6 p 1225 – 1229) a propõe como conjunto de quesitos fundamentais a serem avaliados diariamente.
Componentes do Fast Hug
São, a seguir, listados os componentes da mneumônica Fast Hug, cada um acompanhado de comentários pertinentes.
F (feeding – alimentação)
A (analgesy – analgesia)
S (sedation – sedação)
T (thromboembolic prophylaxis – profilaxia de tromboembolismo)
H (head of bed elevated - cabeceira elevada do leito)
U (stress ulcer prevention – prevenção de úlcera de estresse)
G (glucose control – controle glicêmico).
F (feeding – alimentação)
Nesse item, chama-se atenção para a evidência de que a nutrição do paciente, quando inadequada, concorre sobremaneira para um maior risco de complicações clínicas e, consequentemente, para um pior prognóstico. Não é incomum a chegada de pacientes em ambiente de UTI já com algum grau de comprometimento nutricional, principalmente aqueles portadores de afecções crônicas, como neoplasias malignas do trato gastrintestinal em estado avançado. Por outro lado, há também aqueles que, em decorrência de um estado franco e prolongado de sepse grave, apresentam síndrome consumptiva significativa. O suporte nutricional merece ser revisto diariamente. De um modo geral, o aporte de 5,6KJ/Kg/dia é suficiente para o atendimento da demanda metabólica do paciente crítico, no entanto, quando lidamos com vítimas de trauma ou portadores de sepse (situações em que o estresse metabólico e as necessidades nutricionais são mais importantes), a dieta deve ser planejada de modo a garantir o dobro desse teor energético. Quando a via oral não se encontra disponível para a administração da dieta, a enteral e, posteriomente, a parenteral podem ser utilizadas (o desescalonamento, isto é, o retorno de dieta parenteral para enteral ou mesmo para oral é recomendável sempre que possível). Estudos mostram que o enriquecimento da nutrição com nutriente especiais, como glutamina, anti-oxidantes e fish-borage oils revela-se benéfica em determinadas situações.
A (analgesy – analgesia)
A dor é um das causas mais importantes de desconforto do paciente crítico internado em UTI, seja ela advinda da própria doença de base, seja de procedimentos inerentes à rotina do serviço – aspirações traqueais, banhos, mudanças de decúbito, coleta de sangue para exames laboratoriais, dentre outros. Desvencilhar o paciente desse tipo de problema não só torna mais humanizado o atendimento, mas também acelera a sua recuperação fisiológica. Sendo um parâmetro de difícil mensuração, a avaliação subjetiva da expressão facial e dos movimentos merece ser realizada, além do acompanhamento de parâmetros como pressão arterial e freqüência cardíaca – geralmente alterados quando da ocorrência de dor. Assim, emprega-se tratamento farmacológico com classes diversas de analgésicos - AINEs, acetaminofeno, opióides (morfina, fentanil, remifentanil), devendo-se optar pela infusão contínua em detrimento da aplicação repetida de bolus. Vale ressaltar que o efeitos colaterais dessa abordagem podem ser esperados, dentre eles depressão respiratória, constipação, hipotensão e alucinações.
S (sedation – sedação)
Não existem regras bem definidas sobre a quantidade e a frequência de administração de drogas sedativas em UTI. Como preceito geral, adota-se a CCC rule – que almeja a manutenção do paciente em um estado calmo, confortável e cooperativo. Escalas de sedação – Ramsay uma das mais populares – são empregadas no sentido de melhorar a precisão da ‘profundidade’ de sedação em que o paciente se encontra. A overdose de sedativos geralmente cursa com aumento do risco de trombonse venos, menor motilidade intestinal, hipotensão, queda da taxa de extração de oxigênio tecidual, aumento do risco de polineuropatia do paciente crítico, prolongamento da estadia na UTI, aumento dos custos da internação, etc. Alguns estudos sugeres a descontinuação diárias das drogas sedativas enquanto recurso para abreviar a estadia em UTI (medida polêmica).
T (thromboembolic prophylaxis – profilaxia de tromboembolismo)
Essa medida costuma ser eventualmente esquecida, mesmo nas prescrições feitas por profissionais experientes no lidar com pacientes críticos, o que resulta em um aumento de 13-31% do risco de tromboses venosas profundas, índice ainda mais significativo quando se tem em vista pacientes vítimas de trauma. Todos, salvo exceções em que o risco supera o benefício da medida, merecem receber pelo menos heparina subcutânea. Deve-se atentar para a chance de sangramentos, principalmente nos pacientes portadores de diátese hemorrágica. Estudos ainda não apresentam consenso no que diz respeito ao melhor tipo de droga a ser usada na profilaxia.
H (head of bed elevated - cabeceira elevada do leito)
A manutenção do tronco elevado a 30º-45º, segundo estudos, reduz a incidência de refluxo gastresofágico em pacientes sob ventilação mecânica, além de reduzir o risco de pneumonia nosocomial. Tal medida é formalmente contra-indicada em pacientes cuja perfusão cerebral encontra-se ameaçada. Na prática, tal elevação não é seguida globalmente.
U (stress ulcer prevention – prevenção de úlcera de estresse)
Trata-se de uma profilaxia importante, sobretudo se há concomitância de insuficiência respiratória aguda, coagulopatia, corticoterapia, histórico de úlcera gastro-duodenal – situações em que ocorre maior risco relativo de sangramento gastrintestinal. Provavelmente, não faz-se necessária para todos os pacientes de UTI, incluindo aqueles politraumatizadas ou em pós-operaório. Opções farmacológicas para a profilaxia são os antiácidos, o sucralfato, os anti-histamínicos, os inibidores de bombas de prótons (não há consenso nos estudos sobre qual seria a classe de 1ª linha). A úlcera de decúbito e a de córnea são também frequentemente negligenciadas na prática, fato que provoca maior morbidade.
G (glucose control – controle glicêmico)
Esse tema fomentou discussões entre intensivistas por bastante tempo, havendo de um lado os defensores do controle estrito dos índices glicêmicos (80-110 mg-dL), enquanto o outro os do controle menos estrito. Recentemente um estudo publicado pelo New England Journal of Medicine mostrou evidências de que o controle estrito promoveria maior mortalidade, sendo por isso o alvo recomendável de 140-180 mg-dL para pacientes com distúrbio glicêmico. De um modo geral, quando comparadas as repercussões negativas advindas da hipoglicemia e da hiperglicemia (leve), sabe-se que a primeira apresenta maior risco de danos imediatos ao paciente, devendo ser preferencialmente evitada.
Considerações Finais
O checklist Fas Hug, quando empregado com critério pelos profissionais de saúde responsáveis por UTIs, resulta em melhoria da qualidade do cuidado oferecido. Apesar disso, seus princípios podem eventualmente não se aplicar a pacientes críticos em algumas condições especiais.
Podemos citar ainda o Processo Mnemônico Expandido  - FAST HUG EPM

Feeding - alimentação
Analgesia
Sedation - Sedação
Thromboembolic Prevention - Profilaxia de tromboembolismo venoso

Head of bed elevated - Cabeceira de cama elevada
Ulcer prophylaxis - Profilaxia de ulceras de stress e de decúbito
Glucose control - Controle de Glicose

Evitar uso desnecessário cateteres e sondas
Programa de desmame
Manter drogas ajustadas pela função hepática e renal

Fontes:
Rosane S. Goldwasser; Cid Marcos David, Weaning from mechanical ventilation: let's perform a strategy - Rev. bras. ter. intensiva vol.19 no.1 São Paulo Jan./Mar. 2007



Desmame e Interrupção da Ventilação Mecânica



   A liberação do paciente do ventilador é um momento muito importante da ventilação mecânica. A utilização de protocolos para reconhecimento dos pacientes aptos a serem extubados contribui com a redução do tempo de internação dos pacientes em unidade de terapia intensiva.

   Retirar o paciente da ventilação mecânica pode ser mais difícil que mantê-lo. O processo de retirada do suporte ventilatório ocupa ao redor de 40% do tempo total de ventilação mecânica. Alguns autores descrevem o desmame como a “área da penumbra da terapia intensiva” e que, mesmo em mãos especializadas, pode ser considerada uma mistura de arte e ciência. Apesar disso, a literatura tem demonstrado, mais recentemente, que protocolos de identificação sistemática de pacientes em condições de interrupção da ventilação mecânica podem reduzir significativamente sua duração. Por outro lado, a busca por índices fisiológicos capazes de predizer, acurada e reprodutivelmente, o sucesso do desmame ventilatório ainda não chegou a resultados satisfatórios.

   
   A retirada da ventilação mecânica é uma importante medida no tratamento intensivo. A utilização de diversos termos para definir este processo pode dificultar a avaliação de sua duração, dos diferentes modos e protocolos e do prognóstico. Por esse motivo, é importante a definição precisa dos termos:

Desmame
O termo desmame refere-se ao processo de transição da ventilação artificial para a espontânea nos pacientes que permanecem em ventilação mecânica invasiva por tempo superior a 24h.

Interrupção da Ventilação Mecânica
O termo interrupção da ventilação mecânica refere-se aos pacientes que toleraram um teste de respiração espontânea e que podem ou não ser elegível para extubação.

O teste de respiração espontânea é a técnica mais simples, estando entre as mais eficazes para o desmame. É realizado permitindo-se que o paciente ventile espontaneamente através do tubo traqueal, conectado a uma peça em forma de “T”, com fonte enriquecida de oxigênio, ou recebendo pressão positiva contínua nas vias aéreas (CPAP) de 5 cmH2O, ou ventilação com pressão de suporte (PSV) de até 7 cmH2O.

Extubação e Decanulação
Extubação é a retirada da via aérea artificial. No caso de pacientes traqueostomizados, utiliza-se o termo decanulação.

Denomina-se re-intubação ou fracasso de extubação, a necessidade de reinstituir a via aérea artificial. A re-intubação é considerada precoce quando ocorre em menos de 48h após a extubação ou decanulação.

Sucesso e Fracasso da Interrupção da Ventilação Mecânica
Define-se sucesso da interrupção da ventilação mecânica como um teste de respiração espontânea bem sucedido. Os pacientes que obtiverem sucesso devem ser avaliados quanto à indicação de retirada da via aérea artificial. Quando o paciente não tolera o teste de respiração espontânea, considera-se fracasso na interrupção da ventilação mecânica. No caso de fracasso o paciente deverá receber suporte ventilatório que promova repouso da musculatura. Uma revisão das possíveis causas desse fracasso deverá ser feita pela equipe assistente, bem como o planejamento da estratégia a ser adotada a seguir, nova tentativa de interrupção da ventilação mecânica ou desmame gradual.

Sucesso e Fracasso do Desmame
Define-se sucesso do desmame a manutenção da ventilação espontânea durante pelo menos 48h após a interrupção da ventilação artificial. Considera-se fracasso ou falência do desmame, se o retorno à ventilação artificial for necessário neste período.

Ventilação Mecânica Prolongada
Considera-se ventilação mecânica prolongada a dependência da assistência ventilatória, invasiva ou não-invasiva, por mais de 6h por dia, por tempo superior a três semanas, apesar de programas de reabilitação, correção de distúrbios funcionais e utilização de novas técnicas de ventilação.

IMPORTÂNCIA DE SE TRAÇAR ESTRATÉGIAS E PROTOCOLOS

Identificar Pacientes Elegíveis para o Teste de Respiração Espontânea

Recomendação: Devem-se estabelecer estratégias para identificar sistematicamente os pacientes elegíveis para o teste de respiração espontânea.

   As diversas estratégias de desmame empregadas refletem julgamentos clínicos e estilos individualizados. Estudos aleatórios e controlados comprovaram que este empirismo aplicado ao desmame prolonga o tempo de ventilação mecânica. É prioritário implementar estratégias para identificar sistematicamente os pacientes elegíveis para o teste de respiração espontânea. Isso reduz o tempo de ventilação mecânica e suas complicações. No entanto, um estudo aleatório e controlado avaliando o efeito de um protocolo de identificação sistemática de pacientes elegíveis para interrupção de ventilação mecânica não mostrou benefício dessa prática, ao contrário de investigações prévias. Tal discrepância foi atribuída às características da unidade onde o estudo foi realizado, a qual dispunha de uma equipe multiprofissional, adequada em número e treinamento, e de visitas diárias estruturadas por checklist, em que um dos itens foi justamente a elegibilidade para interrupção da ventilação mecânica.

Interrupção Diária da Sedação
Recomendação: Pacientes sob ventilação mecânica recebendo sedativos, particularmente em infusão contínua, devem ter sedação guiada por protocolos e metas que incluam interrupção diária da infusão.

  A administração contínua de sedativos é um preditor independente de maior duração da ventilação mecânica, maior permanência na UTI e no hospital. Kress e col. conduziram um estudo aleatório e controlado com 128 pacientes para verificar o efeito da interrupção diária da sedação na duração da ventilação mecânica, tempo de estadia em UTI e tempo de internação hospitalar. Foi observada redução na mediana de duração de ventilação mecânica em 2,4 dias (p = 0,004) e na mediana de tempo de internação na UTI em 3,3 dias (p = 0,02) no grupo intervenção, comparado com o grupo em que a sedação não foi interrompida.

   Protocolos para desmame conduzidos por profissionais de saúde não-médicos reduzem o tempo de desmame. Dentro destes, os protocolos para manuseio de sedação e analgesia implementados por enfermeiros. Um desses protocolos mostrou uma redução na duração da ventilação mecânica em dois dias (p = 0,008), redução do tempo de permanência em UTI em dois dias (p < 0,0001) e redução na incidência de traqueostomia no grupo de tratamento (6% x 13%, p = 0,04)13. Em determinadas situações clínicas, como utilização de miorrelaxantes, instabilidade hemodinâmica, fase aguda da síndrome do desconforto respiratório agudo e outras, a interrupção dos agentes sedativos deverá ser avaliada pela equipe.

INTERRUPÇÃ O DA VENTILAÇÃ O MECÂNICA
Identificando Pacientes Elegíveis para o Teste de Respiração Espontânea

Recomendação: A avaliação para iniciar o teste de respiração espontânea deve ser baseada primariamente na evidência de melhora clínica, oxigenação adequada e estabilidade hemodinâmica.

Para se considerar o início do processo de desmame é necessário que a doença que causou ou contribuiu para a descompensação respiratória encontre-se em resolução, ou já resolvida. O paciente deve apresentar-se com estabilidade hemodinâmica, expressa por boa perfusão tecidual, independência de vasopressores (doses baixas e estáveis são toleráveis) e ausência de insuficiência coronariana descompensada ou disritmias com repercussão hemodinâmica. Além disto, deverá ter adequada troca gasosa (PaO2 ≥ 60 mmHg com FIO2 ≤ 0,4 e PEEP ≤ 5 a 8 cmH2O) e ser capaz de iniciar os esforços inspiratórios.

Uma vez bem sucedido o teste de respiração espontânea, outros fatores deverão ser considerados antes de se proceder a extubação, tais como o nível de consciência, o grau de colaboração do paciente e sua capacidade de eliminar secreções respiratórias, entre outros, que serão discutidos a seguir.

Como Fazer o Teste de Respiração Espontânea
   Demonstrou-se que um teste de respiração espontânea com duração de 30 min a duas horas foi útil para selecionar os pacientes prontos para extubação4,15-20. Esses mesmos estudos mostraram taxa de re-intubação em torno de 15% a 19% nos pacientes extubados. 

   A desconexão da ventilação mecânica deve ser realizada oferecendo oxigênio suplementar a fim de manter taxas de saturação de oxigênio no sangue arterial (SaO2) acima de 90%. A suplementação de oxigênio deve ser feita com uma FIO2 até 0,4, não devendo ser aumentada durante o processo de desconexão. Outros modos podem ser tentados para o teste de respiração espontânea, como a ventilação com pressão positiva intermitente bifásica (BIPAP – biphasic positive airway pressure) e a ventilação proporcional assistida (PAV - proportional assist ventilation). Estes modos tiveram resultados iguais ao do tubo-T e PSV no teste de respiração espontânea. Recentemente, uma comparação entre a compensação automática do tubo (ATC – automatic tube compensation) associada ao CPAP versus CPAP isolado mostrou-se favorável ao primeiro durante o teste de respiração espontânea. Houve maior identificação de pacientes extubados com sucesso com o ATC (82% versus 65%)24. Protocolos computadorizados de desmame, presentes em alguns ventiladores, demonstraram abreviação do tempo de ventilação mecânica em número reduzido de ensaios clínicos aleatórios e devem ser observados em novos estudos.

   Os pacientes em desmame devem ser monitorados de forma contínua quanto às variáveis clínicas, às alterações na troca gasosa e às variáveis hemodinâmicas.
   
   A avaliação contínua e próxima é fundamental para identificar precocemente sinais de intolerância e mecanismos de falência respiratória. Caso os pacientes apresentem algum sinal de intolerância, o teste será suspenso e haverá o retorno às condições ventilatórias prévias. Aqueles pacientes que não apresentarem sinais de intolerância deverão ser avaliados quanto à extubação e observados (monitorados) por 48h na UTI. Se, após 48 horas, permanecerem com autonomia ventilatória, o processo estará concluído com sucesso. Se neste período necessitarem do retorno à ventilação mecânica serão considerados como insucesso.

Critérios de Interrupção (Fracasso) do Teste de Respiração Espontânea

Parâmetros Clínicos e Funcionais para Interromper o Teste de Respiração Espontânea

Freqüência respiratória > 35 ipm
Saturação arterial de O2 < 90%
Freqüência cardíaca > 140 bpm
Pressão arterial sistólica > 180 mmHg ou < 90 mmHg

Sinais e sintomas
Agitação, sudorese, alteração do nível de consciência

Conduta no Paciente que não Passou no Teste de Respiração Espontânea
Repouso da Musculatura
Recomendação: Os pacientes que falharam no teste inicial deverão retornar à ventilação mecânica e permanecer por 24h em modo ventilatório que ofereça conforto, expresso por avaliação clínica. Neste período serão reavaliadas e tratadas as possíveis causas de intolerância.

   O principal distúrbio fisiológico existente na insuficiência respiratória parece ser o desequilíbrio entre a carga imposta ao sistema respiratório e a habilidade em responder a essa demanda. Existem várias evidências para se aguardar 24h antes de nova tentativa de desmame, para que haja recuperação funcional do sistema respiratório e de outras causas que possam ter levado à fadiga muscular respiratória, como o uso de sedativos, alterações eletrolíticas, entre outras. Nos pacientes que desenvolvem fadiga muscular, a recuperação não ocorre em menor período. A aplicação do teste de respiração espontânea com tubo-T duas vezes ao dia não foi benéfica em relação à sua aplicação uma vez ao dia.

Nova Tentativa após 24 Horas
Recomendação: Admitindo que o paciente permaneça elegível e que as causas de intolerância foram revistas, novo teste de respiração espontânea deverá ser realizado após 24h.

   Há evidências de que a realização diária de teste de respiração espontânea abrevia o tempo de ventilação mecânica, em relação aos protocolos em que o teste não é realizado diariamente.

Conduta no Paciente que Passou no Teste de Respiração Espontânea
Uma vez que o paciente passou no teste de respiração espontânea, ele pode ou não ser elegível para extubação no mesmo dia, dependendo de outros fatores.

TÉCNICAS DE DESMAME

Redução Gradual da Pressão de Suporte
   O modo pressão de suporte também pode ser utilizado no desmame gradual de pacientes em ventilação mecânica. Isso pode ser feito através da redução dos valores da pressão de suporte de 2 a 4 cmH2O, de duas a quatro vezes ao dia, tituladas conforme parâmetros clínicos, até atingir 5 a 7 cmH2O, níveis compatíveis com os do teste de respiração espontânea. Esta estratégia foi estudada no desmame gradual de pacientes em ventilação mecânica em ensaios clínicos aleatórios. No estudo de Brochard e col., o uso da pressão suporte resultou em menor taxa de falha de desmame, quando comparado ao desmame em ventilação mandatória intermitente sincronizada e ao desmame com períodos progressivos (5 a 120 min) de respiração espontânea em tubo-T. Já no estudo de Esteban e col., o desmame em pressão de suporte foi inferior ao desmame em tubo-T, em termos de duração e taxa de sucesso.

Ventilação Mandatória Intermitente Sincronizada
Recomendação: Evitar o modo ventilação mandatória intermitente sincronizada sem pressão de suporte (SIMV) como método de desmame ventilatório.

   O modo ventilatório SIMV intercala ventilações espontâneas do paciente com períodos de ventilação assisto-controlada do ventilador mecânico. O desmame com este método é realizado reduzindo-se progressivamente a freqüência mandatória do ventilador artificial. Em quatro estudos prospectivos, foi consenso ter sido este o método menos adequado empregado, pois resultou em maior tempo de ventilação mecânica. Na sua maioria, estes estudos utilizaram o método SIMV sem suporte pressórico. No estudo de Jounieux e col., o modo SIMV foi estudado com e sem PSV com tendência, porém sem significância estatística, a favorecer o desmame no grupo que usou PSV associado.

Outros Modos
Novos modos de ventilação, como volume suporte e ventilação de suporte adaptativa vêm sendo desenvolvidos, com vistas a facilitar e acelerar o desmame ventilatório. Sua eficácia, no entanto, ainda não foi comprovada em investigações amplas, quando comparado aos modos mais tradicionais de desmame.

ÍNDICES FISIOLÓGICOS PREDITIVOS DE FRACASSO DE DESMAME E EXTUBAÇÃO
Recomendação: Os índices fisiológicos preditivos de desmame pouco auxiliam na decisão de iniciar ou não períodos de respiração espontânea, ou na redução da taxa de suporte ventilatório. A relação freqüência respiratória/volume-corrente (f/VT – índice de respiração rápida superficial) parece ser a mais acurada.

FATORES
CONDIÇÃO NECESSÁRIA
Evento agudo que motivou a VM

Revertido ou controlado
Troca gasosa 
PaO2 ≥ 60 mmHg com FIO2 ≤ 0,40 e PEEP ≤ 5 a 8 cmH2O

Avaliação hemodinâmica
Sinais de boa perfusão tecidual, independência de vasopressores (doses baixas e estáveis são toleráveis), ausência de insuficiência coronariana ou disritmias com repercussão hemodinâmica
Capacidade de iniciar esforço inspiratório
Sim
Nível de consciência
Paciente desperta ao estímulo sonoro, sem agitação psicomotora
Tosse
Eficaz
Equilíbrio ácido-básico
pH ≥ 7,30
Balanço hídrico
Correção de sobrecarga hídrica
Eletrólitos séricos (K, Ca, Mg, P)
Valores normais
Intervenção cirúrgica próxima

Não

   Os índices fisiológicos deveriam acrescentar dados preditivos à avaliação clínica do desmame, resultando em redução das taxas de fracasso de desmame e extubação e menor tempo de ventilação mecânica. Além disso, a técnica utilizada para sua obtenção deveria ser reprodutível, acurada, segura e de fácil realização. Infelizmente, nenhum índice fisiológico tem todas essas características.

  Existem mais de 50 índices descritos, e apenas alguns auxiliam significativamente, com mudanças em relação à tomada de decisões clínicas quanto à probabilidade de sucesso ou fracasso de desmame.

Entre os índices mensurados durante o suporte ventilatório, apenas cinco têm possível valor em predizer o resultado do desmame:

1. Força inspiratória negativa;
2. Pressão inspiratória máxima (PImax);
3. Ventilação minuto (V’E);
4. Relação da pressão de oclusão da via aérea nos primeiros 100 ms da inspiração (P0,1) pela pressão inspiratória máxima (P0,1/PImax); e
5. CROP: complacência, freqüência, oxigenação, pressão.

Dos índices descritos, apenas os dois últimos apresentam taxas de probabilidade sugerindo aplicação clínica.

Entre os índices medidos durante ventilação espontânea, a acurácia é melhor em relação aos seguintes parâmetros, quando medidos durante 1 a 3 minutos de respiração espontânea: freqüência respiratória, volume-corrente e relação freqüência / volume-corrente (f/VT – índice de respiração rápida superficial), sendo este último o mais acurado. Entretanto, mesmo estes testes estão associados a mudanças pequenas ou moderadas na probabilidade de sucesso e fracasso no desmame.

EXTUBAÇÃO TRAQUEAL

Teste de Permeabilidade
Recomendação: O teste de permeabilidade (escape aéreo entre via aérea e cânula traqueal após desinsuflação do balonete) pode ser usado para identificar pacientes com maior probabilidade de obstrução de via aérea, por edema ou granuloma, após a extubação traqueal, especialmente após ventilação mecânica prolongada.

A intubação traqueal pode causar inflamação e edema laríngeo, predispondo à obstrução da via aérea (manifesta clinicamente pelo estridor laríngeo), tão logo o tubo traqueal seja retirado. Essa é uma importante causa de fracasso na extubação. O teste de permeabilidade consiste em medir o volume-corrente expiratório através do tubo traqueal com o balonete insuflado e a seguir desinsuflar o balonete e medir novamente o volume-corrente expiratório. Se houver escape aéreo em torno do tubo traqueal (definindo a existência de espaço entre o tubo e a via aérea), o volume-corrente expiratório será menor que o volume-corrente inspiratório, sugerindo menor probabilidade de edema laríngeo e estridor após extubação. Estudos mais antigos verificaram o escape aéreo de forma qualitativa. Mais recentemente, outros estudos quantificaram-no. Miller e col. estudaram 100 intubações consecutivas e observaram estridor laríngeo em 80% dos pacientes, em que a diferença entre o volume-corrente inspiratório e o volume-corrente expiratório após (média de três medidas) foi ≤ 110 mL. Já, 98% daqueles em que o vazamento foi > 110 mL não apresentaram estridor.

O teste de permeabilidade mostrou-se útil em identificar maior risco de estridor pós-extubação traqueal em pacientes que permaneceram mais de 48h intubados em UTI gerais. Por outro lado, não foi um bom preditor de estridor pós-extubação traqueal em pacientes em pós-operatório de cirurgia cardíaca, nos quais o tempo médio de intubação traqueal foi de 12h.

Uma boa higiene de vias aéreas superiores, visando à prevenção de aspiração das secreções que se pode acumular na traquéia, acima do balonete, deve ser realizada.

Cuidados Gerais Pré-Extubação
Recomendação: Antes de proceder a extubação, a cabeceira do paciente deve ser elevada, mantendo-se uma angulação entre 30º e 45º. Também é indicado que se aspire a via aérea antes de extubá-lo.

O acúmulo de secreção e a incapacidade de eliminá-la através da tosse são fatores que contribuem de maneira importante para o insucesso da extubação traqueal, mesmo após um teste de respiração espontânea bem sucedido. Nos pacientes que apresentaram alguma dificuldade no procedimento de intubação traqueal ou que tenham importantes fatores de risco para complicações obstrutivas após extubação, pode-se optar por assegurar a via aérea pérvia, mantendo-se um trocador de cânula endotraqueal em posição por algumas horas, até que se tenha maior segurança quanto ao sucesso da extubação.

Aspirar as vias aéreas antes da extubação tem como objetivos diminuir a quantidade de secreção nas vias aéreas baixas e retirar a secreção que se acumula acima do balonete da cânula traqueal, evitando a sua aspiração para os pulmões. A elevação da cabeceira visa, por sua vez, a diminuir a probabilidade do paciente aspirar o conteúdo gástrico. Dessa forma pretende-se diminuir as possibilidades de infecção respiratória.

TRAQUEOSTOMIA
Recomendação: A traqueostomia precoce (até 48h do início da ventilação mecânica) em pacientes com previsão de permanecer por mais de 14 dias em ventilação mecânica reduzem a mortalidade, a pneumonia associada à ventilação mecânica, os tempos de internação em UTI e de ventilação mecânica.

Durante muito tempo não foi possível definir o papel da traqueostomia no desmame ventilatório e o momento certo de realizá-la. Não há uma regra geral em relação ao tempo que se deve realizar a traqueostomia e este procedimento deve ser individualizado. Embora haja alguma divergência de resultados, a traqueostomia diminui a resistência e o trabalho ventilatório, facilitando o desmame dos pacientes com alterações acentuadas da mecânica respiratória. Metanálise publicada em 1998 deixou claro que não existia, até então, uma definição quanto ao momento mais adequado para indicar a traqueostomia, uma vez que os estudos eram discordantes, alguns não eram aleatórios na escolha dos pacientes e nenhum era duplamente encoberto. Entretanto, recentemente, estudo aleatório, envolvendo pacientes que presumivelmente permaneceriam intubados por mais que 14 dias (pacientes com doença neurológica de progressão lenta ou irreversível e/ou doença de via aérea superior), mostrou benefício em termos de mortalidade, incidência de pneumonia, tempo de internação em UTI e tempo de ventilação mecânica nos pacientes submetidos à traqueostomia precoce (nas primeiras 48h de intubação traqueal). Cabe salientar, entretanto, que este trabalho não deixou claro quais foram os critérios sugestivos de maior tempo de intubação traqueal e necessidade de ventilação mecânica. Também é importante enfatizar que, mantendo boas práticas em relação à insuflação do balonete, o tubo traqueal pode ser mantido por tempo superior a três semanas sem lesão laríngea ou traqueal.

OUTROS ASPECTOS ASSOCIADOS À INTERRUPÇÃO DA VENTILAÇÃO MECÂNICA E AO DESMAME VENTILATÓRIO
Vários aspectos relacionados à qualidade da assistência ao paciente com insuficiência respiratória têm efeito direto na eficiência e efetividade do desmame. Alguns itens foram abordados nos demais capítulos do Consenso. Seguem algumas recomendações específicas dos processos de desmame e de interrupção da ventilação mecânica.

Dispositivos Trocadores de Calor
Recomendação: Deve-se estar atento à possível contribuição negativa dos trocadores de calor nos pacientes com falência de desmame.

Os umidificadores trocadores de calor vêm progressivamente substituindo os aquecedores dos ventiladores. Dois estudos aleatórios compararam o efeito destes dispositivos sobre parâmetros fisiológicos respiratórios. Os pacientes em uso de trocadores de calor apresentaram significativo aumento de volume-minuto, freqüência respiratória, PaCO2, trabalho da respiração, produto pressão x tempo, pressão esofágica e transdiafragmática, PEEP intrínseco, acidose respiratória, além de maior desconforto respiratório. Os autores concluíram que a presença de dispositivos trocadores de calor deve ser levada em conta nos pacientes de desmame difícil, especialmente aqueles com insuficiência ventilatória crônica.

Hemotransfusões
Recomendação: Transfusões sangüíneas não devem ser usadas rotineiramente visando a facilitar o desmame ventilatório.

Não há evidência de que uma estratégia liberal referente a transfusões sangüíneas (reposição de glóbulos em pacientes com hemoglobina ≤ 9 mg/dL) tenha reduzido o tempo de duração mecânica em uma população heterogênea.

Suporte Nutricional
Recomendação: Dietas de alto teor de gordura e baixo teor de carboidratos podem ser benéficas em pacientes selecionados, com limitada reserva ventilatória, para redução do tempo de desmame. Entretanto, em virtude do pequeno número de estudos não se recomenda o seu uso rotineiro.

As dietas com elevado teor de gordura e baixo teor de carboidratos parecem produzir efeitos favoráveis na produção de CO2, o que pode facilitar o desmame de pacientes com limitada reserva ventilatória, inclusive em reduzir o tempo de desmame. O motivo da utilização das dietas de alto teor de gordura e baixo teor de carboidrato consiste em que um menor quociente respiratório pode melhorar a troca gasosa e facilitar o desmame da ventilação mecânica em pacientes com reserva ventilatória limitada. Entretanto, os estudos ainda não têm respaldo para uma recomendação mais ampla.

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